HERBART E O ENSINO EXPOSITIVO DA ESCOLA TRADICIONAL
Johann F. Herbart (1776-1841) era alemão e trouxe grande contribuição para a Pedagogia como ciência, buscando o maior rigor de método. Pode-se ainda dizer que Herbart é o precursor de uma psicologia experimental aplicada à pedagogia.
Herbart desenvolve uma pedagogia social e ética com finalidade de formar o caráter moral por meio do esclarecimento da vontade, que se alcança pela instrução. Para ele, a educação moral (formação da vontade) não se separa da instrução (esclarecimento intelectual), o que supõe uma unidade das atividades mentais (querer e pensar).
Herbart rejeita a clássica doutrina das faculdades isoladas da alma e compreende a vida psíquica como uma unidade nas suas operações básicas de conhecer, sentir e querer. Assume, porém, uma posição intelectualista, que privilegia o conhecimento ao considerar o sentir e o querer funções secundárias e derivadas do processo ideativo. Herbart introduziu os conceitos de "consciência", "limiar da consciência" e "inconsciente". Para ele, o fluxo da consciência é oscilante, uma vez que várias representações dos objetos permanecem algum tempo na consciência, com intensidade diferente, algumas no limiar, subindo para o foco de atenção ou desaparecendo depois, temporariamente, no inconsciente. A grande massa submersa não é esquecida, podendo voltar à consciência a qualquer momento e, aliás, está sempre tentando voltar. O esforço para retornar à consciência provoca os sentimentos de prazer ou dor, que resultam do aparecimento daquelas representações na consciência ou da submersão no inconsciente. Processa-se dessa forma o "círculo de pensamento": "dos pensamentos saem sentimentos e, destes, princípios e modos de ação". Assim o desejo é transformado em volição, isto é, em possibilidade de sua concretização.
Se os sentimentos e as volições derivam secundariamente do conflito entre as representações, torna-se enorme a importância do professor, que educa os sentimentos e os desejos dos alunos por meio do controle de suas ideias. Daí a importância da instrução, caminho para a moralidade. Por isso Herbart reconhece a necessidade de utilizar o rigor de um método para a educação da vontade.
Segundo Herbart, a conduta pedagógica segue três procedimentos básicos: o "governo", a "instrução" e a "disciplina".
O "governo" é a forma de controle da agitação infantil, levado a efeito inicialmente pelos pais e depois pelos professores, a fim de submeter a criança às regras do mundo adulto e tornar possível o início da instrução. Além da vigilância constante, caso necessário, pode-se recorrer às proibições, ameaças e punições, evidentemente com as devidas recomendações para evitar excessos contraproducentes. É preciso ainda combinar autoridade e amor, além de manter a criança sempre ocupada.
A "instrução", procedimento principal da educação, supõe o desenvolvimento dos "interesses". O conceito de interesse adquire em Herbart um sentido básico e muito específico, a partir da tendência íntima do indivíduo de trazer ou não um objeto de pensamento à tona. O movimento de retorno à consciência pode ser estimulado pelas leis da frequência e da associação, que levam à formação do hábito. Por isso o interesse é um poder ativo que determina quais ideias e experiências receberão atenção. De acordo com Frederick Eby, "a suprema arte do educador é, por conseguinte, trazer constantemente para a atenção aquelas ideias que ele deseja que dominem a vida de seu aluno. Controlando, assim, a experiência da criança, o instrutor constrói massas de ideias que, por sua vez, desenvolvem-se pela assimilação de novos materiais" (p. 412). Para Herbart, a instrução é compreendida como construção, o que o leva a não separar a instrução intelectual da moral, pois uma é condição da outra. Se formar moralmente uma criança significa educar sua vontade, é preciso maior clarificação das representações e crescimento das ideias na sua mente. É assim que Herbart julga possível trazer à mente, com frequência, as representações mais adequadas, visando o controle do interesse. Convém ainda estimular o aparecimento de interesses múltiplos para que a educação seja completa.
A "disciplina" é o terceiro procedimento básico da conduta pedagógica que mantém firme a vontade educada no propósito da virtude. Enquanto o governo é exterior e heterônomo, mais usado com crianças pequenas, a disciplina supõe a autodeterminação característica do amadurecimento moral, que leva à formação do caráter proposta.
Insatisfeito com a precária assimilação de todo o ensinamento das escolas, Herbart atribui a causa à aplicação inadequada dos métodos, incapazes de relacionar os conhecimentos adquiridos com a experiência do indivíduo, o que resulta em material inutilmente memorizado e logo esquecido. Para evitar o insucesso, Herbart propõe os "cinco passos formais", que propiciam o desenvolvimento do aluno: (1) "preparação": o professor recorda o já sabido, a fim de que o aluno traga à consciência a massa de ideias necessárias para criar interesse pelos novos conteúdos; (2) "apresentação": o conhecimento novo é apresentado, sem esquecer a clareza, que para Herbart significa sempre partir do concreto; (3) "assimilação" (ou associação ou comparação): o aluno é capaz de comparar o novo com o velho, perceber semelhanças e diferenças; (4) "generalização" (ou sistematização): além das experiências concretas, o aluno é capaz de abstrair, chegando a concepções gerais; esse passo é importante sobretudo na adolescência; (5) "aplicação": por meio de exercícios, o aluno mostra que sabe aplicar o que aprendeu em exemplos novos; só assim a massa de ideias adquire sentido vital, deixando de ser mera acumulação inútil de informação.
Herbart foi o primeiro a elaborar uma pedagogia que pretende ser ciência da educação. O caráter de objetividade de análise, a tentativa de psicometria, o rigor dos passos seguidos e a sistematização são aspectos que determinam a sua grande influência no pensamento pedagógico. Os cinco passos formais marcam o ensino expositivo da escola tradicional, que adquire um caráter de rigor por empréstimo do método científico a indução, isto é, o caminho do raciocínio que vai do concreto para o abstrato. Revelam também os pressupostos epistemológicos do empirismo, subjacentes ao método de Herbart. Para ele, o conhecimento é oferecido pelo professor ao aluno, que só posteriormente o aplica à experiência vivida.
Contudo, a sua psicologia sofre inúmeras restrições. Ainda que tenha corretamente refletido sobre a unidade da vida psíquica, exagera ao admitir que impulsos e desejos possam nascer das ideias. Daí a crítica que sofreu, sobretudo da Movimento da Escola Nova, ao caráter excessivamente "intelectualista" do seu projeto. Considerar a possibilidade de controlar o sentir e o querer supõe depositar otimismo demasiado no poder da educação. Este mesmo poder significa a diminuição do campo de atuação livre do educando. Tanto controle tornaria viável a passagem do "governo" para a "disciplina"?
Referências:
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofia da Educação. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1996.
__________. História da Educação. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1996.
EBY, Frederick. História da educação moderna: teoria, organização e práticas educacionais. 5. ed. Porto Alegre: Globo, 1978.
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