A REFORMA LEÔNCIO DE CARVALHO (1879): A LEGISLAÇÃO QUE REGULAMENTOU O FUNCIONAMENTO DE ESCOLAS NORMAIS PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E A CRIAÇÃO DE INSTITUIÇÕES DE ENSINO PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL, EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E ALFABETIZAÇÃO DE ADULTOS

Por DERMEVAL SAVIANI
O Decreto n.º 7.247, de 19 de abril de 1879, também conhecido como Reforma Leôncio de Carvalho, reformou o ensino primário, secundário e superior no município da Corte. Trata-se de um longo texto composto de 174 itens agrupados em 29 artigos, eventualmente desdobrados em parágrafos e incisos, porém não ordenados em títulos ou capítulos.
A essência da Reforma é apresentada logo no artigo primeiro ao proclamar que ‘é completamente livre o ensino primário e secundário no município da Corte e o superior em todo o Império, salva a inspeção necessária para garantir as condições de moralidade e higiene’, completado com quatro parágrafos que estipulam as condições e sanções para a necessária inspeção.
Essa referência à ‘moralidade e higiene’ traz à tona um elemento que ocupou lugar central no ideário pedagógico brasileiro no Segundo Império e ao longo da Primeira República: o higienismo. Conformam esse discurso pedagógico de teor médico-higienista enunciados como ‘a educação é um salutar remédio para curar as doenças da sociedade e da civilização’; a ‘disseminação das escolas é o único meio para nos livrar da chaga do analfabetismo’; ‘o espalhamento das luzes da instrução é um poderoso antídoto para curar as doenças da ignorância e da pobreza’, que transportaram o discurso médico para as falas dos educadores, políticos e da intelectualidade de modo geral. Na expressão particular do discurso médico é, sem dúvida, o discurso liberal iluminista que aí se faz presente.
Em continuidade com a Reforma Couto Ferraz (1854), a Reforma Leôncio de Carvalho mantém a obrigatoriedade do ensino primário dos 7 aos 14 anos (artigo 2.º), a assistência do Estado aos alunos pobres (idem), a organização da escola primária em dois graus com um currículo semelhante, levemente enriquecido (artigo 4.º) e o serviço de inspeção (artigo 13).
Em ruptura com a reforma anterior, regulamenta o funcionamento das Escolas Normais fixando o seu currículo, a nomeação dos docentes, o órgão dirigente e a remuneração dos funcionários (artigo 9.º).
Inovando em relação à Reforma Couto Ferraz (1854), a nova reforma prevê a criação de jardins de infância para as crianças de 3 a 7 anos (artigo 5.º); caixa escolar (artigo 6.º); bibliotecas e museus escolares (artigo 7.º); subvenção ao ensino particular, equiparação de Escolas Normais particulares às oficiais e de escolas secundárias privadas ao Colégio Pedro II, criação de escolas profissionais, de bibliotecas populares e de bibliotecas e museus pedagógicos onde houver Escola Normal (artigo 8.º); regulamentação do ensino superior abrangendo a associação de particulares para a fundação de cursos livres (artigo 21); permissão a particulares para abrir cursos livres em salas dos edifícios das Escolas ou Faculdades do Estado (artigo 22); faculdades de direito (artigo 23); e faculdades de medicina (artigo 24).
Ainda em relação à Reforma Couto Ferraz (1854), cabe registrar que a Reforma Leôncio de Carvalho levou bem mais longe a inclusão de dispositivos referentes ao funcionamento da educação nas províncias. Assim, o artigo 8.º contempla, nas províncias, a subvenção a escolas particulares; a contratação de professores particulares para ministrar os rudimentos do ensino primário; a criação de cursos de alfabetização de adultos e de Escolares Normais; fundação de bibliotecas e museus pedagógicos e de bibliotecas populares; e a criação, nos municípios mais importantes das províncias, de escolas profissionais e de ensino de artes e ofícios. A Reforma previu, também, a abertura, nas províncias, de mesas de exames de preparatórios (artigos 11 e 12) e a inspeção dos estabelecimentos de instrução primária e secundária (artigo 15).
Referência:
SAVIANI, Dermeval. História das ideias pedagógicas no Brasil. 5. ed. Campinas: Autores Associados, 2019.



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