A HISTÓRIA DAS DIRETRIZES NACIONAIS PARA A ELABORAÇÃO, AQUISIÇÃO E UTILIZAÇÃO DO LIVRO DIDÁTICO
(Vamos compreender o processo histórico que resultaria no atual Programa Nacional do Livro Didático – PNLD?)
Por TÂNIA REGINA DE LUCA (Universidade Estadual Paulista – UNESP)
(1) GUSTAVO CAPANEMA, O ESTADO NOVO E A CRIAÇÃO DA COMISSÃO NACIONAL DO LIVRO DIDÁTICO EM 1938:
Na gestão de Gustavo Capanema, o Ministério da Educação e Saúde promoveu uma série de medidas para incentivar, organizar e controlar a produção destinada ao público escolar, seja de livros propriamente didáticos ou de literatura infantil. Nesse sentido, destaque-se especialmente a criação da Comissão Nacional do Livro Infantil (1936), a Comissão Nacional do Ensino Primário (1938) e a Comissão Nacional do Livro Didático (1938). Esta última foi instituída pelo Decreto-Lei n.º 1.006, de 30 de dezembro, que, ao longo de 40 artigos, estipulava diretrizes para a elaboração e a utilização de livros didáticos, instituía a comissão nacional responsável por sua avaliação, detalhava o processo de autorização e os motivos que justificavam o seu veto. Estipulava que, a partir de 1.º de janeiro de 1940, livros sem a autorização do ministério não poderiam ser utilizados nas escolas pré-primárias, primárias, normais, profissionais e secundárias de toda a República.
À comissão cabia proceder à análise dos materiais didáticos submetidos pelos autores e editores, elaborar uma relação oficial para servir de orientação à escolha dos professores de escolas públicas ou privadas, além de estimular e orientar a produção de livros didáticos, sugerir a abertura de concursos para a produção de obras inexistentes e organizar exposições nacionais dos livros didáticos autorizados. Note-se que o Estado não produzia material, nem tampouco impunha a adoção de um livro escolar único, mas limitava o universo de opções, na medida em que a seleção deveria ser feita a partir da lista oficial, sob a responsabilidade de especialistas nomeados para a tarefa pelo presidente da República.
A preocupação de centralizar as decisões, conduzir uma política unificada para todo o país e intervir na produção, com a delimitação de diretrizes gerais que puniam qualquer crítica ao regime político em vigor e ao chefe da nação, assinala um novo patamar de intervenção na produção didática.
(2) O REGIME MILITAR E A CRIAÇÃO DA COMISSÃO DO LIVRO TÉCNICO E LIVRO DIDÁTICO EM 1966:
Após a experiência de 1938, a intervenção mais direta do Estado na questão do livro didático deu-se em 1966, durante a ditadura militar, quando foi criada a Comissão do Livro Técnico e Livro Didático, cuja função era coordenar a produção, edição e distribuição de obras do gênero. Seguiram-se vários outros órgãos, como o Instituto Nacional do Livro Didático (1971), que administrava e gerenciava os recursos financeiros destinados à política educacional e desenvolveu o Programa do Livro Didático para o Ensino Fundamental; a Fundação Nacional do Material Escolar (1976), incumbida de executar os programas voltados para o livro didático e sucedida pela Fundação de Assistência ao Estudante (1983), que assumiu as responsabilidades para com o livro didático.
(3) A CRIAÇÃO DO PROGRAMA NACIONAL DO LIVRO DIDÁTICO (PNLD) EM 1985:
O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), criado em 1985, introduziu modificações na política até então adotada, com destaque para o processo de avaliação dos livros, iniciado em 1996. A compra e a distribuição de obras didáticas foram sendo progressivamente aumentadas até se atingir a universalização das disciplinas e séries do ensino fundamental regular. E, a partir de 2005, teve início o Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio (PNLEM), que, a exemplo do anterior, pretende contemplar o conjunto de estudantes desse nível de ensino.
À luz da trajetória do negócio livro didático, o PNLD pode ser encarado como o ápice de um processo que, de forma institucional, possibilita às empresas envolvidas na edição desse tipo de material um mercado não apenas seguro e estável, mas em constante crescimento, num contexto em que a compra e venda de livros didáticos correspondem a mais de 60% do total das atividades. Essa circunstância, que não deixa de remeter à forma de funcionamento do nosso capitalismo, sempre tão ávido em obter o apoio e as benesses do Estado, talvez explique a rapidez com que as empresas deixaram de questionar o direito do comprador de avaliar e passaram a se adequar às suas exigências.
A destinação de recursos para a compra de livros, por mais correta e justa que seja, não invalida a tarefa de se inquirir sobre os efeitos que a interferência do Estado na avaliação e compra teve (e tem) sobre as empresas editoriais. O mercado brasileiro é de tal ordem que atrai o interesse do capital internacional, que, por seu turno, já se estrutura para lançar livros de alcance suprarregional, o que por si só já constitui um complexo objeto de reflexão, uma vez que o livro escolar segue guardando forte relação com a construção de identidades, sobretudo as nacionais.
Comentários
Postar um comentário
Evitar comentários que: (1)sejam racistas, misóginos, homofóbicos ou xenófobos; (2) difundam a intolerância política; (3) atentem contra o Estado Democrático de Direito; e (4) violem a honra, dignidade e imagem de outras pessoas. Grato pela compreensão.