A ESCOLÁSTICA, A SÍNTESE TOMISTA E A EDUCAÇÃO COMO ATIVIDADE QUE TORNA REALIDADE AQUILO QUE É POTENCIAL

A Escolástica é a mais alta expressão da filosofia cristã medieval. Desenvolve-se desde o século IX, tem seu apogeu no século XIII e começo do XIV, entrando em decadência até o Renascimento. Chama-se Escolástica por ser a filosofia ensinada nas escolas. "Scholasticus" é o professor das artes liberais e mais tarde também o professor de filosofia e teologia, oficialmente chamado "magister".

Os parâmetros da educação na Idade Média se fundam na concepção do homem como criatura divina, de passagem pela Terra e que deve cuidar, em primeiro lugar, da salvação da alma e da vida eterna. Tendo em vista as possíveis contradições entre fé e razão, recomenda-se respeitar sempre o "princípio da autoridade", que exige humildade para consultar os grandes sábios e intérpretes, autorizados pela Igreja, sobre a leitura dos clássicos e dos textos sagrados. Evita-se, assim, a pluralidade de interpretações e se mantém a coesão da Igreja.

A Escolástica inicia a sistematização da doutrina, recorrendo cada vez mais ao concurso da razão. No período áureo da Escolástica (séculos XII e XIII), os teólogos procuram apoiar a fé na razão, a fim de melhor justificar as crenças, converter os não-crentes e ainda combater os infiéis. Em face das heresias, não é possível apenas impor a crença, sendo necessário o trabalho de argumentação, sustentável por um sistema lógico de exposição e defesa dos pontos de vista.

A filosofia se torna estudo obrigatório do teólogo, desde que saiba compreender o limite da atuação dela. Na Idade Média é considerada "serva da teologia" ("ancilla theologiae"), porque a razão encontra-se a serviço da fé. O embasamento para as argumentações é fornecido pela lógica aristotélica, sobretudo pelo silogismo, forma acabada do pensamento dedutivo. A dedução é um tipo de raciocínio que parte de proposições gerais para chegar a conclusões particulares. Nesse processo, do conhecido são tiradas as conclusões nele implícitas.

Segundo José Silveira da Costa, "munidos do instrumental para a discussão, surgem inúmeros comentadores dos textos sagrados da Bíblia e dos escritos dos Padres da Igreja que alargam a reflexão pessoal, criando o 'método escolástico', constituído por várias etapas: a leitura ('lectio'), o comentário ('glossa'), as questões ('quaestio') e a discussão ('disputatio') (COSTA, 1993, p. 25). Nem sempre essas discussões permitem voos muitos altos, de tal forma se acham vinculadas às verdades reveladas e ao estrito controle da ortodoxia religiosa, temerosa dos desvios heréticos. Cada tópico é analisado com o mais extremo rigor conforme a lógico aristotélica e com tal sobrecarga de análise e comentários de cada título, que o "estudante ficava emaranhado numa multidão de sutis distinções metafísicas" (COSTA, 1993, p. 36).

No século XIII, apogeu da Escolástica, seu principal expoente é o dominicano São Tomás de Aquino (1225-1274), que demonstra esforço na divulgação e no comentário da obra de Aristóteles, adaptando-a à verdade revelada. Escreve diversas obras, destacando-se a "Suma Teológica", um monumental trabalho de síntese. Até essa época, o pensamento de Aristóteles fora difundido pelos filósofos árabes Avicena (século XI) e Averróis (século XII). Por isso mesmo era visto com muita desconfiança pela Igreja, sobretudo porque as traduções de sua obra estavam comprometidas por não serem feitas diretamente do grego para o latim, mas do hebreu ou do árabe.

A respeito de Pedagogia, São Tomás escreve "De Magistro", obra homônima à de Santo Agostinho, da qual retoma muitos conceitos. Por exemplo, diz São Tomás: "Parece que só Deus ensina e deve ser chamado Mestre" (COSTA, 1993, p. 70). Para São Tomás, a educação é uma atividade que torna realidade aquilo que é potencial. Assim, nada mais é do que a "atualização" das potencialidades da criança, processo que o próprio educando desenvolve com o auxílio do mestre. A ideia de atualização das potencialidades se sustenta também na teoria aristotélica da matéria e da forma, dois princípios indissociáveis. Apesar da importância da vontade humana nesse processo, o ensino depende das Santas Escrituras e da graça da Providência Divina, uma vez que o homem tem natureza corrompida. A educação não é mais do que um meio para atingir o ideal da verdade e do bem, superando as dificuldades interpostas pelas tentações do pecado.

A ideia de um princípio divino ordenador do mundo é o cerne do pensamento tomista. Ao apresentar a quinta (e última) das famosas provas da existência de Deus, São Tomás argumenta que a ordem e a finalidade no universo devem-se a uma inteligência ordenadora. Assim, se no mundo tudo tende para um fim, de maneira a realizar o que é melhor, "os seres são dirigidos por algo cognoscente e inteligente, como a flecha é dirigida pelo arqueiro. Por conseguinte, existe um ser inteligente pelo qual as coisas naturais são ordenadas, visando a um fim; e a esse ser denominamos Deus" (COSTA, 1993, p. 70). Desse modo, todas as criaturas de Deus só podem aspirar por Ele. A semente do carvalho aspira à perfeição de sua forma, o animal busca realizar seu instinto. O homem, no entanto, por possuir inteligência, deve aprender a discernir, dentre os diversos bens, aquele que é o Bem supremo. E nesse momento está sujeito ao erro (e ao pecado), quando escolhe um bem menor, como o prazer sensual, por exemplo.

A metafísica de São Tomás desemboca na ética, que por sua vez fornece os elementos para uma Pedagogia, como instrumento para realizar no homem o que pede sua natureza: "O bem objetivo, único capaz de proporcionar à natureza humana a felicidade perfeita, é Deus. A razão, secundada pela revelação, mostra o caminho que se deve seguir para alcançá-lo" (COSTA, 1993, p. 70).

Referência:
COSTA, José Silveira da. Tomás de Aquino: a razão a serviço da fé. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1993 (Coleção Logos).



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