POR QUE APRENDI QUE É IMPORTANTE SER SEMPRE UM BOM ESPÍRITO REVOLUCIONÁRIO EM SUA PRÓPRIA VIDA?

Por JORGE ESCHRIQUI

Como contribuir para a transformação do país, do continente e do mundo em um lugar melhor para a humanidade viver se eu mesmo tornei-me incapaz de fazer uma revolução pacífica, mas contínua, na minha vida nos últimos tempos? Por que ao invés de ajudar os semelhantes e espalhar com o meu pequenino conhecimento - se comparado com a grandeza de todo o saber produzido pelo ser humano ao longo da História - pelos caminhos as sementes de esperança, luta, determinação e justiça social, eu venho me olhando todos os dias no espelho e me julgando como uma espécie de vítima da vida? De que adiantou ler, estudar, pesquisar e escrever sobre a biografia e a produção intelectual de figuras tão proeminentes da história brasileira, latino-americana e mundial e ouvir letras de canções que embalaram e conduziram a mudanças fundamentais nos contextos históricos e nas sociedades em que foram produzidas, se eu sou incapaz de ouvi-las e fazer delas hinos para a esperança de dias melhores em minha própria vida? Quando ajo assim, eu simplesmente rasgo os meus diplomas acadêmicos, desonro os orientadores de pesquisa vivos e mortos que passaram por minha vida e deixaram marcas inapagáveis na minha formação como indivíduo, intelectual e ator da História. Quando eu me acovardo diante de uma fase ruim e temporária (porque nada nesta vida é eterno, inclusive a própria vida, sendo que a única certeza que qualquer pessoa possui é da morte física um dia), deixo morrer dentro de mim aquele jovem que começou um dia a graduação cheio de sonhos...
Não basta somente ser um intelectual e educador que produz e difunde conhecimentos, ajuda a construir saberes eternizados em cada indivíduo que foi e será o meu aluno e colabora com informações e análises críticas e reflexivas para cidadãos mais conscientes do seu papel na História, se eu mesmo tornei-me incapaz de enfrentar os meus medos, os meus desafios pessoais e as minhas incertezas quanto ao amanhã, vitimizando-me diariamente e desejando ser um alguém que ficou no passado. Estou sendo egoísta quando ao invés de estender a mão a alguém que precisa, simplesmente estendo a minha própria em troca de migalhas de compaixão, tornando-se um mendigo de sentimentos.
Não, basta! Nada de autopiedade. O que acertei ou errei ficou para trás na estrada da vida. A juventude e com ela muitos sonhos e muitas ilusões também se perderam ao longo do caminho. Porém, há coisas que não se podem jamais perder enquanto o sangue correr nas veias, o coração pulsar e a cabeça pensar: a fibra, a determinação, a garra, o tesão em viver!
Melhor aprender agora determinadas lições importantes sobre a vida do que deixar para a velhice. Aliás, feliz aquele que ainda consegue chegar lá pleno e dizer que valeu a pena. E eu aprendi com as minhas dores e as palavras, ora duras e necessárias, ora amáveis e fraternas, que: (1) não adianta apenas ter se eu não posso usufruir ou fazer do bem material algo que faça a vida mais leve; (2) a beleza física é passageira e o que restará no futuro incerto é o que carrego na coração, na mente e nas atitudes cotidianas; (3) até dos piores momentos se pode tirar boas lições para toda a vida; (4) jamais ter vergonha de manifestar bons sentimentos e demonstrar gestos amorosos com aqueles que são imprescindíveis em nossa existência, pois não sabemos se amanhã não será já tarde demais; (5) a fé no sobrenatural, em si mesmo, na humanidade não podem apagar, uma vez que ela é chama que inflama o coração e dá a coragem para enfrentar, lutar e desejar voos mais altos para si e a humanidade; e (6) nunca julgar alguém apenas pelas posses, aparência ou títulos, pois cada indivíduo, ainda que em seu mais simples conhecimento, em suas mais humildes condições de vida e em sua estética que possa parecer simples ou fora do padrão ideal pela sociedade, carrega consigo experiências, saberes e sentimentos que podem nos tornar mais humanos.
Não. Nada de fotos em decadência. Nada de autopiedade. Nada de mendigaria de sentimentos. Quando ajo assim, não amando a mim mesmo, deixo toda forma de amor morrer dentro de mim e passo a não ter reservas suficientes de amor para compartilhar com os meus semelhantes, o meu trabalho e as minhas causas pessoais e coletivas. Não sou assim fisicamente. Estou assim e não cabe a mim achar culpados, lastimar a vida e suplicar atenção. O que me compete é agir conforme o que escrevo para os outros. Ter dignidade própria para poder exigir dignidade para outras pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade social. Um bom revolucionário não precisa sempre de armas, mas de bom senso e tática para transformar o mundo. Além disso, não pode se entregar diante da primeira, segunda, terceira ou quantas derrotas vierem. Um bom revolucionário é sonhador, mas sem tirar os pés do chão. Apega-se a mínima chance de vitória enquanto muitos combatentes já consideram a batalha totalmente perdida. E acima de tudo, se for para tombar, que seja com honradez, de pé e preferencialmente sem gemer ou lastimar da sorte ou falta dela. O bom revolucionário sabe que podem apagá-lo para a existência no plano físico, mas sempre haverá alguém para lembrá-lo por suas ações, exemplos e pensamentos.
Intelectual de vanguarda, ou seja, da linha de frente do combate por um mundo melhor. É isto que preciso ser nestes momentos. Eu não tenho armas, mas tenho o dom da escrita para ajudar nas pequenas revoluções sociais. Nem sempre é preciso ser forte fisicamente, mas ter a compreensão para saber sobre os seus próprios limites e batalhar até este limite, de preferência pacífica e democraticamente, por novas conquistas. Afinal, a incerteza e os novos amores estão na frente, mas a história sempre está na mão, caminhando, ensinando e aprendendo sempre uma nova lição.
Quem deseja nunca machucar-se, que jamais tente colher as rosas que possam estar na beira do caminho... O preço de ter uma rosa na mão muitas vezes é o ferir-se e sangrar. Mas sempre vale a pena para quem tem coragem de colhê-las, pois só assim poderá desfrutar e sentir próximo de si a beleza e o aroma de dias melhores.




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