O TERROR PSICOLÓGICO QUE PREPAROU A QUEDA DO GOVERNO GOULART EM 1964 E A ELEIÇÃO DE BOLSONARO EM 2018

(Para uma reflexão histórica sobre a presença permanente da ameaça comunista no inconsciente da sociedade brasileira)

Uma das causas mais importantes para a queda "tão rápida" do presidente João Goulart (e ascensão rápida do deputado do "baixo clero" Jair Bolsonaro à Presidência da República em 2018) foi o terror psicológico, pouco a pouco habilmente instilado na consciência social do país. Esse terror psicológico se baseava sobretudo no anticomunismo, campanha desencadeada pelos interessados na derrubada de Goulart ( e, em 2018, por ideias anacrônicas de autoritarismo e retorno dos militares ao poder através da figura de Bolsonaro). Ainda que de uma forma primária, com acusações que só teriam algum cabimento no ano 1935 com a fracassada Intentona Comunista, esse terror consistia sobretudo em: (1) apresentar o comunismo como um regime de terror em que os burgueses e anticomunistas seriam todos fuzilados e as mulheres socializadas; (2) o Brasil seria dominado por uma República Sindicalista em que operários brutos e analfabetos estariam mandando; (3) as Igrejas seriam fechadas; (4) todas as terras seriam desapropriadas. Basta examinar os jornais da época, sobretudo de 1963 (e, em 2018, principalmente as redes sociais e várias mensagens de Whatsapp), para verificar como os articuladores se esmeravam em demonstrar que o comunismo estava para chegar, destruir tudo e implantar o terror no país e submetê-lo à URSS (nos dias atuais, troque-se este país por China).
Essa espécie brasileira de McCarthismo se tornou ainda mais grave com a chegada ao Brasil do presidente Tito, da Iugoslávia, no início dos anos 1960 (troque-se esta personagem histórica por um Nicolás Maduro da Venezuela ou Miguel Díaz Canel de Cuba). Cada jornal procurava se esmerar, mais do que outro, em mostrar como Tito era criminoso que se alimentava de crianças ao almoço e burgueses ao jantar (vide algumas notícias reais ou fake news que circulam e são espalhadas atualmente nas redes sociais e no Whatsapp de bolsonaristas sobre como Cuba, Venezuela, Coreia do Norte, China, etc.). Destacavam-se nos anos 1960 A Gazeta, o Estado de São Paulo e a Folha de São Paulo (hoje há para este papel veículos de "imprensa" como TV Record, SBT, Jornal Zero Hora, Rádio Gaúcha e Rádio Jovem Pan).
Essa onda de terror anticomunista foi, num crescendo, espalhando-se pela consciência social de S. Paulo, do Rio, de Minas, e por todo o país, influindo mesmo nas transações comerciais. Os bancos tinham medo de emprestar dinheiro, o industrial tinha medo de falar aos seus operários e restringiam a produção, a taxa de desenvolvimento caíra para 2% (Vide as expectativas/ análises de mercado e as fake news de apoiadores de Bolsonaro que projetavam erroneamente, em 2018, com a vitória da extrema direita, inflação minúscula, baixíssimas taxas de desemprego, baixos juros, indíces elevados de crescimento da economia, dólar a R$ 1,50, gasolina a R$ 2, 50, gás de cozinha a R$ 30,00, etc.).
O comício de 13 de março de 1964, do Rio, era uma ameaça concreta à democracia, a República Sindical estava chegando, a URSS invadia o Brasil (em 2018, o único capaz de derrotar a 'República Sindical Corrupta' do Partido dos Trabalhadores e de seus aliados de esquerda era o bolsonarismo, impedindo-se assim a tomada de vez do país pela China). Em 1964, tais eram os slogans da imprensa. A resposta veio imediatamente no dia 19, na famosa "Marcha da Família com Deus pela Liberdade" (pode-se trocar atualmente esta nomenclatura por "Marcha para Jesus"), organizada por alguns deputados paulistas (hoje bancada evangélica) e apoiados por alguns grupos religiosos católicos (hoje predominantemente grupos religiosos neopentecostais), sobretudo ingênuas freiras (atualmente as "irmãs" e os "irmãos" de igreja com as suas bíblias em baixo dos braços ou nas mãos), em que milhares e milhares de mulheres se concentraram na Praça da Sé, de terço na mão, rezando como se houvesse chegado a "hora final", o fim do mundo (nos dias atuais, pode-se falar mais em oração). Por todo o país se espalhava uma angústia que consistia no pavor de uma possível guerra civil em que os brasileiros e católicos (hoje, sobretudo evangélicos) teriam de defender-se contra a sublevação comunista e a invasão russa (hoje, chinesa), como se encouraçados soviéticos já estivessem no porto ou desembarcando em Santos (ironicamente, os "comunistas" dos dias atuais estão mais sofisticados, pois precisariam criar somente um vírus - que mataria o próprio povo chinês e aliados? - e uma vacina com um suposto chique (Que tecnologia super avançada! Esses "comunistas" são realmente geniais!) para tornar o povo brasileiro todo comunista!).
Em 1964 (assim como em 2018), essa angústia atingiu também os indiferentes, os sem partido, os neutros, os que não sabiam para que lado inclinar-se, e agora de deixavam tomar pelo terror, certos de que essa angústia somente terminaria com a queda de Jango (e na história nacional do tempo presente, com a chegada do bolsonarismo no poder). Era preciso acabar com isso!".
Em 1964, os militares e os apoiadores do autoritarismo precisaram dar um golpe de Estado e contar com o apoio externo dos Estados Unidos em um contexto de guerra fria para tomarem o poder. Em 2018, apesar de outras alternativas ao PT, o povo brasileiro, em eleições legítimas, entregou o poder "de bandeja" para uma extrema direita autoritária que lotava cada vez mais o aparelho burocrático de militares reacionários, que liderados por Jair Bolsonaro, utilizavam-se das estruturas físicas, políticas e jurídicas do Estado Democrático de Direito para destruir a democracia. E o pior, sob os olhares indiferentes de uma parcela considerável da sociedade brasileira.
Referência:
BASBAUM, Leôncio. História sincera da República - de 1961 a 1967. 3. ed. São Paulo: Alfa-Ômega, 1983, v. 4.



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