A ESCOLA DEVE ATENDER ÀS EXIGÊNCIAS DE TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS

(A RAZÃO DO MEU PROJETO DAS ESCOLAS-CLASSE E ESCOLAS-PARQUE NA BAHIA E EM BRASÍLIA)

Por ANÍSIO SPÍNOLA TEIXEIRA (Caetité-Bahia, 12 de julho de 1900 - Rio de Janeiro, 11 de março de 1971. Jurista, intelectual, educador e escritor brasileiro)

A escola fundamental deve ser animada pela vocação não somente de reproduzir o ambiente existencial da sociedade, mas também de erguê-la a nível superior de eficiência ao existente no país. Na escola-classe predominaria o sentido preparatório para posteriores encaminhamentos e na escola-parque, conjunto de edifícios reservados a atividades práticas e sociais, educação física e de arte, predominarão as fases em que o aluno, pelo senso de responsabilidade e trabalho material, executaria coisas de valor utilitário, usufruindo, ao mesmo tempo, de lazer, jogos, teatro, música, dança, leitura.
Bem sei que a experiência tradicional da escola é manter a sociedade existente. Em país como o nosso, porém, em que o povo propriamente dito não constitui uma classe, mas volumoso resíduo, impõe-se reconhecer à escola primária função bem mais ampla que a da escola primária tradicional nas sociedades já desenvolvidas. Ela terá de proporcionar oportunidades educativas em função das mudanças que se processam, porque a aceleração do desenvolvimento econômico e social põe todos, ricos e pobres, na necessidade de encontrar na escola muito mais do que dela esperavam as crianças do século dezenove ou mesmo do século XX até a Segunda Guerra Mundial.
Sem dúvida, por toda a parte, será a escola de atender a exigências das transformações sociais e, de modo peculiarmente intenso, nas nações ainda pobres ou ainda atrasadas. As massas acordaram, estão confusamente conscientes da possibilidade de ascender a tipos mais elevados de bem-estar, porém de onde surgirão os recursos para essa batalha, que é a batalha da paz? Surgirão como apareceram em todas as batalhas da sobrevivência defrontadas pela espécie?
Há, sem dúvida, um desafio. Em face dele, as nações pobres ou subdesenvolvidas se capacitarão de que recursos à educação devem nivelar-se pelo menos aos da industrialização? Outra dificuldade existe, que explica, pelo menos em parte a questão. No processo acidental das nações, segundo acontece no chamado mundo da livre concorrência (aquele não compulsoriamente planejado), a educação visa dominantemente o consumo da riqueza adquirida, ou em vias de aquisição. Educam-se os indivíduos para participar da riqueza em expansão e, secundariamente, para ajudar e consolidar a expansão. A escola passa a desenvolver-se, às vezes, com aceleração considerável, no propósito de atender as pressões de mudança do status social, que a riqueza provoca e causa, objetivando colocar maior número de pessoas em condições de consumi-la. Este tipo de educação, que o desenvolvimento ocidental promove, embora não seja primariamente destinado a preparar o produtor concorre indiretamente para esse fim quando misturada com eficiência.
Ora, sucede nas nações pobres, que, mesmo esse tipo de educação para o consumo, ordinariamente mais econômico do que o processo de educação para a produção, não chega a ser dado com eficiência e, deste modo, nem sequer secundariamente ajuda o aumento da produtividade. Tal fato, embora raramente formulado, acha-se na base de toda descrença generalizada de economistas e homens práticos na eficácia da escola como agente do processo de desenvolvimento. E daí a resistência à distribuição de recursos necessários à aceleração do processo educativo.
Inspirado no modelo de Escola Parque Carneiro Ribeiro da Bahia, planejei estrutura semelhante para Brasília. A educação primária, organizada em Centros de Educação Elementar, compreendia jardim de infância; escolas-classe; escolas-parque; biblioteca infantil e museu; pavilhão para atividades de artes industriais; conjunto para atividades de recreação; conjunto para atividades sociais (música, dança, teatro, clubes, exposições); dependência para refeitório e administração; pequenos conjuntos residenciais para menores sem família, de 7 a 14 anos.
Constituída de quadras a estrutura urbana da capital, cada quadra, abrigando população variável de 2.500 a 3.500 habitantes, ofereceria à população escolarizável de cada uma delas: jardim de infância, dotado de 4 salas, escola-classe provida de 8 salas para dois turnos. Para cada grupo de 4 quadras, uma escola parque destinada a atender em dois turnos 2.000 alunos.
Os Centros de Educação Média abrangeriam: (a) cursos de humanidades; (b) cursos técnicos e comerciais; (c) cursos científicos. Haveria um Parque de Educação Física (voleibol, basquete, piscina, campos de futebol), um Núcleo Cultural (teatro, exposições, clubes), biblioteca, museu, administração, restaurante.
Referência:
TEIXEIRA, Anísio Spínola. Uma experiência de educação primária integral no Brasil. Apud. LIMA, Hermes. Anísio Teixeira: estadista da educação. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.



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