O QUE PODEMOS APRENDER COM JOHN DEWEY E ANÍSIO TEIXEIRA SOBRE DIVERSIDADE E EDUCAÇÃO INCLUSIVA?

    Por JORGE ESCHRIQUI

A proposta de universalização do acesso à educação básica de Anísio Teixeira fundamenta-se na filosofia instrumentalista/ experimentalista/pragmática do pensador e pedagogo norte-americano John Dewey que defende a ideia de uma relação direta entre a consolidação da ordem democrática numa determinada sociedade e o aprendizado significativo de conteúdos diretamente vinculados com a realidade do aluno, tornando-o um sujeito ativo na construção do saber por meio de práticas interativas de ensino-aprendizagem que possibilitam a comparação entre os conhecimentos adquiridos em outros espaços sociais e fases da vida com os obtidos no ambiente escolar. Nesse processo, o professor não é a figura autoritária a quem cabe apenas impor ordem e disciplina e a própria encarnação do detentor do saber inquestionável em sua disciplina, a quem os estudantes devem apenas ouvir e anotar pacificamente os conteúdos ministrados que a posteriori serão memorizados temporariamente para uma aprovação em avaliações, não se considerando as peculiaridades do desenvolvimento cognitivo de cada indivíduo, os interesses pessoais e a construção de um saber coletivo entre alunos e docente em sala de aula. Este modelo tradicional de ensino não forma cidadãos críticos, reflexivos e entusiastas pela participação nas decisões coletivas da sociedade, mas apenas sujeitos acríticos e treinados (para não se dizer adestrados) para cumprirem ordens e obedecerem de modo inquestionável decisões impostas desde um centro de poder (ainda que em prejuízo dos interesses coletivos), o que não contribui efetivamente em nada para a formação de homens e mulheres conscientes da importância dos direitos e deveres existentes em um Estado Democrático de Direito.
Quando John Dewey e Anísio Teixeira propõem uma escola nova baseada na universalização do acesso a um ensino de qualidade para todos, eles pensam numa instituição que deve se pautar pelo respeito à diversidade independentemente de diferentes individuais. O valor principal que norteia a corrente pedagógica da educação progressiva é a ideia de uma inclusão calcada no princípio da igualdade e diversidade, concomitante com as propostas de uma sociedade democrática e mais justa. As ideias de educação de John Dewey e Anísio Teixeira fundamentam-se na concepção de educação de qualidade para todos, respeitando a diversidade dos alunos e realizando o atendimento às suas necessidades educativas. Isto implica em adaptações do processo de ensino às diferenças e necessidades individuais de aprendizagem de cada aluno. É desta forma que a palavra diversidade ganha pleno sentido numa perspectiva de multiplicidade de diferenças que há entre os indivíduos em uma sociedade.
Diverso é aquilo que é múltiplo de diferenças. A palavra "humanidade" já possui uma simbologia de diversidade, uma vez que aquela é constituída por grupos humanos que são diversos, tendo cada um seus padrões culturais, noções éticas, morais e outras séries de juízos que moldam uma sociedade, que servem como modelo para as suas comunidades específicas. Portanto, uma visão bem saudável e politicamente real sobre o mundo que nos cerca, a partir das reflexões educacionais de John Dewey e Anísio Teixeira, é pensar as sociedades nos âmbitos do respeito, assimilação e reconhecimento das diversidades e não desde uma perspectiva segregacionista.
Os seres humanos são ligados por sentimentos que podem ser os mais diversos possíveis (raiva, amor, apatia, etc.). Logo, é possível pensar, a partir do pensamento de John Dewey e Anísio Teixeira, que é importante que as pessoas tenham a possibilidade de viver de uma maneira mais autônoma dentro de um ambiente escolar que verdadeiramente os acolha, sentindo-se assim estimulados e à vontade para se arriscarem no processo de aquisição do saber, tendo a oportunidade de experimentar realidades diversas, mas sem deixarem de partilhar as mesmas atividades e experiências em nível de igualdade. Dessa maneira, a escola torna-se um espaço de socialização capaz de preparar indivíduos para saberem se portar diante das diversidades sociais e assumirem o papel de protagonista de sua história de vida pessoal e coletiva.
Uma escola capaz de proporcionar sem discriminação de origem socioeconômica, racial ou de outro tipo um ensino de qualidade está desempenhando com um certeza absoluta uma proposta de inclusão. Qual é a melhor escola para isto do que a pública? Todavia, isto demanda, como defende Anísio Teixeira, a remoção de barreiras históricas de desigualdades e injustiças sociais por meio de uma boa gestão administrativa pública. Afinal, leis, decretos, instruções, recomendações, discussões e manifestações a favor de um ensino de qualidade e inclusivo tendem a virar "letra morta" se todos os fatores causadores da exclusão não forem revistos pelas administrações públicas federais em harmonia com as estaduais e municipais. Não há como sanear a consequência do problema sem atingir a causa. Não há como pensar em inclusão a qualquer título sem antes acabar com a exclusão!
Foi pensando em políticas públicas para a constituição de um modelo de sistema educacional inclusivo que Anísio Teixeira propôs a descentralização do poder, isto é, a municipalização da gestão da educação brasileira para proporcionar uma aproximação entre as decisões e os anseios das comunidades a partir das demandas de cada realidade local. Em outras palavras, Anísio pensou uma gestão escolar democrática e participativa responsável pelo envolvimento de todos que, direta ou indiretamente, fazem parte do processo educacional através sobretudo dos Conselhos Municipais de Educação. Desse modo, o estabelecimento de objetivos, a solução de problemas, os planos de ação e sua execução, o acompanhamento e a avaliação das políticas educacionais passam a ser de responsabilidade não somente de gestores públicos (União, Estados, Municípios), mas também das comunidades locais. As políticas educacionais no Brasil devem ser pensadas e refletidas levando-se em consideração o tipo de formação almejada pelo mercado de trabalho em cada região, as culturas regionais, a realidade financeira/orçamentária de cada Estado e Município e os anseios das comunidades. A colaboração e a assistência técnica e financeira entre os entes federativos e a participação das comunidades nas decisões é fundamental para a tomada de decisões democráticas que contribuam para o desenvolvimento da educação pública brasileira. Tal processo pode parecer inicialmente lento, conflituoso, mas a sociedade e o Estado precisam conhecer os desafios que impedem um ensino inclusivo e de qualidade no país, conciliarem os diversos interesses e mediá-los em prol do futuro das novas gerações e da ordem democrática.



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