POR QUE O BRASIL NECESSITA DE ESCOLA PÚBLICA, UNIVERSAL, GRATUITA, DE QUALIDADE E EM TEMPO INTEGRAL?

Por ANÍSIO SPÍNOLA TEIXEIRA
A escola primária é a base da educação de toda nação. Dela é que depende o destino ulterior de toda cultura de um povo moderno. Se de outras se pode prescindir e a algumas nem sempre se pode atingir, ninguém dela deve ser excluído, sob qualquer pretexto, sendo para todos imprescindível. Façamo-la já, de todos e para todos. Em épocas passadas, a cultura de um país podia basear-se em suas universidades. As civilizações fundadas em elites cultas e povos ignorantes prescindiram da escola primária. As sociedades constituídas por privilegiados e multidões subjugadas também sempre prescindiram da cultura popular.
As democracias, porém, sendo regimes de igualdade social e povos unificados, isto é, com igualdade de direitos individuais e sistema de governo de sufrágio universal, não podem prescindir de uma sólida educação comum, a ser dada na escola primária, de currículo completo e dia letivo integral, destinada a preparar o cidadão nacional e o trabalhador ainda não qualificado e, além disto, estabelecer a base igualitária de oportunidades, de onde irão partir todos, sem limitações hereditárias ou quaisquer outras, para os múltiplos e diversos tipos de educação semiespecializada, ulteriores à educação primária.
Nos países economicamente desenvolvidos, até a educação média, imediatamente posterior à primária, está se fazendo também comum e básica. E a tanto também nós tendemos e devemos mesmo aspirar.
A educação comum, para todos, já não pode ficar circunscrita à alfabetização ou à transmissão mecânica das três técnicas básicas da vida civilizada – ler, escrever e contar. Já precisa formar, tão solidamente quanto possível, embora em nível elementar, nos seus alunos, hábitos de competência executiva, ou seja, eficiência de ação; hábitos de sociabilidade, ou seja, interesse na companhia de outros, para o trabalho ou o recreio; hábitos de gosto, ou seja, de apreciação da excelência de certas realizações humanas (arte); hábitos de pensamento e reflexão (método intelectual) e sensibilidade de consciência para os direitos e reclamos seus e de outrem.
Vejam bem que não se insiste na quantidade de informação (instrução) que a escola primária vá dar ao seu aluno; mas, por outro lado, o que se lhe pede é muito mais do que isto. Daí, o corolário imperioso: sendo a escola primária a escola por excelência formadora, sobretudo porque não estamos em condições de oferecer a toda população mais do que ela, está claro que, entre todas as escolas, a primária, pelo menos, não pode ser de tempo parcial. Somente escolas destinadas a fornecer informações ou certos limitados treinamentos mecânicos podem ainda admitir o serem de tempo parcial.
A escola primária, visando, acima de tudo, a formação de hábitos de trabalho, de convivência social, de reflexão intelectual, de gosto e de consciência não pode limitar as suas atividades a menos que o dia completo. Devem e precisam ser de tempo integral para os alunos e servidas por professores de tempo integral.
Não me direis que faltam recursos para tal plano, em um país cujos aumentos de salários orçam por dezenas de bilhões de cruzeiros. Faltará, talvez, prioridade para as despesas necessárias, e só isto. A maior tarefa que um povo, uma nação pode distribuir a um corpo de seus servidores é: a da formação básica do brasileiro, para a sua grande aventura social de construção do Brasil.
Referência:
TEIXEIRA, Anísio Spínola. Educação não é privilégio. Rio de Janeiro: José Olympio, 1957.



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