A CULTURA NACIONAL E A VALORIZAÇÃO DA DIVERSIDADE PELA EDUCAÇÃO ESCOLAR

Por ANÍSIO SPÍNOLA TEIXEIRA (Caetité-Bahia, 12 de julho de 1900 - Rio de Janeiro, 11 de março de 1971. Jurista, intelectual, educador e escritor brasileiro)

A minha tese é a de que a diversificação é a condição de florescimento das culturas, e a uniformidade, a condição de sua morte e petrificação. E isto me parece tão objetivo e exato que julgo do próprio interesse dos que desejam conservar certos traços da cultura de um povo a promoção do processo de diversificação. Porque a diversificação age contra os sinais de decrepitude e estagnação, revitalizando os próprios tecidos culturais em processo de mortificação provocada pela uniformidade e imutabilidade. A unidade da cultura brasileira poderá e deverá ser a unidade dinâmica de uma cultura diversificada pelas regiões brasileiras. Nessa unidade, assim compósita e complexa, os nossos cuidados são mais no sentido de manter diversidades naturais e vivedouras do que de aumentar a unidade, por ilusórias imposições preconcebidas, pois sabemos que uma cultura somente floresce à custa das interações entre as suas diferentes modalidades e variedades. O entrechoque consciente das diferenças e oposições é que cria a unidade dinâmica que, esta sim, devemos todos promover.
A educação faz-nos conscientes de nossa cultura viva e diversificada, e assim é que lhe promove a unidade, revelando-nos as suas particularidades e diferenças, e fundindo-as em um processo dinâmico e consciente de harmonia e coesão.
Na medida em que formos conhecedores de nossa cultura, nessa medida seremos instrumentos de sua unidade, pois esta decorrerá muito do grau de consciência que temos de suas diversidades e do sentido orgânico que deste modo lhe dermos. O enriquecimento e o florescimento da cultura brasileira dependerão do grau e extensão com que as diversificações sejam mantidas e se comuniquem e se influenciem mutuamente. Deste ponto de vista, a unidade da cultura brasileira será sempre mais um resultado da liberdade com que as suas culturas regionais possam coexistir e se entrefecundar do que de qualquer plano unificador.
A liberdade de diversificação regional, o ajustamento e adaptação aos particularismos e às condições locais são elementos essenciais para o enriquecimento e a vida de uma cultura e, na extensão continental do Brasil, estas são as nossas esperanças de poder desenvolver uma cultura orgânica e vivaz, e uma verdadeira civilização brasileira.
A escola, na sua função de fator de transmissão da cultura, promove-lhe a unidade desde que a retrate com fidelidade e riqueza, e contribua para que se torne mais consciente. Essa unidade, porém, preexiste à escola, que apenas a prolonga nas novas gerações.
Logo que as culturas se fazem conscientes, entram a variar e diversificar, e eis aí o que assegura o seu continuado crescimento e maior florescimento. A unidade decorre, então, do grau de consciência que possui a comunidade para integrar, vitalmente, as mudanças, variedades e diversificações. É a percepção e o conhecimento desse processo de crescimento que promovem e alimentam a nova, sempre nova unidade dinâmica da cultura. Neste sentido é que a escola, sendo um dos processos de transmissão da cultura e de transmissão em grande parte consciente, ajuda e promove a unidade cultural, na medida em que retratar essa cultura com fidelidade e riqueza, em todo o seu dinamismo. Na medida, porém, em que a deformar ou a retratar só parcialmente, ou se recusar a perceber-lhe as diversificações e as mudanças, poderá operar como um fator de bloqueio, de estagnação e, por conseguinte, de desagregação ou de degeneração.
Referência:
TEIXEIRA, Anísio Spínola. A educação e a crise brasileira. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2005.



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