O MEDO E A IGNORÂNCIA SÃO AS ARMAS DOS FANÁTICOS E NÃO DOS HOMENS DE INTELIGÊNCIA E DOS EDUCADORES*

Por ANÍSIO SPÍNOLA TEIXEIRA (Caetité-Bahia, 12 de julho de 1900 - Rio de Janeiro, 11 de março de 1971. Jurista, intelectual, educador e escritor brasileiro)

Estou cada vez mais convencido de que a escola não pode ser reformada diretamente, de que a escola depende do meio da grande ignorância geral. Esta é que deve ser o objetivo das campanhas das inteligências independentes. Só as inteligências independentes podem fazer alguma coisa para remover o medo e a ignorância, as duas armas dos fanáticos de toda a parte.
Somos, por ausência substancial de instrução – é preciso sempre lembrar que não tivemos nem ensino secundário, nem universitário – um País sem moralidade de ideias, sem inteligência de consequências, com uma vida social sem lógica, sem ordenação, sem sentido ideológico. Esse aspecto se revela em nossa usual observação de que nada tem consequência no Brasil, e no espanto do estrangeiro ante o sentido diverso que os fatos e os atos têm aqui entre nós. Diverso do da Europa, do da América, de todos os países de civilização similar.
Se fosse só isso, porém, o Brasil não poderia durar. Qualquer coisa substitui essa falta essencial de moralidade e seriedade social. E essa qualquer coisa é o nosso conceito privado de moralidade. Somos o País da amizade pessoal. Substituímos a estrutura ideológica coletiva da sociedade, a moralidade de ideias, a moralidade do interesse geral por uma base sentimental.
Como, pois, nessa sociedade, fazer qualquer coisa com ideias e por ideias? Como, pois, fazer o brasileiro compreender que as ideias tomadas a sério reformariam a vida? Como, pois, dar base racional à nossa vida social? É esse o problema em que me debato hoje. É essa dificuldade que me põe extraordinariamente modesto nas minhas perspectivas de ação social no Brasil.
Teremos de sofrer um pouco para fazer da democracia uma realidade, mas muito mais teremos de sofrer se, por desespero infantil, buscarmos soluções desesperadas em um País como o nosso. Tenho horror a qualquer confusão mental, tenho horror à instabilidade, e tenho horror aos temperamentos pouco lúcidos.
Há qualquer coisa de muito mais poderoso que nós – é a nova geração. Devemos pensar e ajudar se possível – para que ela faça melhor do que nós.
* Carta escrita a Hermes Lima (Bahia, 12 de agosto de 1937). Apud. VIANA FILHO, Luís. Anísio Teixeira: a polêmica da educação. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.



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