OS MÉTODOS ULTRAPASSADOS DE AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO BÁSICA E A REPRODUÇÃO DAS INJUSTIÇAS E DESIGUALDADES SOCIAIS

Por JORGE ESCHRIQUI
Desperta atenção o fato de que a avaliação consta no atual cenário educacional como um dos desafios a serem enfrentados pelo processo de ensino e aprendizagem. Um instrumento pedagógico criado inicialmente para diagnosticar e possibilitar uma compreensão dos fracassos escolares, hoje contribui para o agravamento desse quadro que é aparentemente irreversível. Se a avaliação se apresenta como um aspecto da vida escolar responsável por traumas e sequelas encravadas nos alunos por meio dos métodos de comparação e divulgação de suas “incompetências”, por outro lado, ela é ainda o recurso que fornece subsídios para se reduzir os males da educação moderna.
Do mesmo modo que todo medicamento possui efeitos colaterais para o tratamento de enfermidades num paciente, sobretudo quando não utilizado em doses racionais, com a avaliação não é diferente. Ela deve ser usada numa tentativa de se fazer um diagnóstico do andamento da aprendizagem perante as metodologias de ensino aplicadas, indicando qual o efeito que os seus ensinamentos têm causado nos estudantes, qual o nível de compreensão, se os pré-requisitos para conhecimentos posteriores foram alcançados e até que ponto sua didática funcionou. A partir daí, é possível se traçar planos de correção das falhas ocorridas no processo de ensino e aprendizagem, abordando-se os mesmos conteúdos curriculares por meio da utilização de metodologias diferentes, de didáticas diversas e, se possível, até mesmo de um contexto diferente.
Entre os possíveis usos irracionais da avaliação para um diagnóstico do processo de ensino e aprendizagem, podem-se citar as avaliações de caráter meramente classificatório, investidas de um aspecto mais punitivo do que educativo. A utilização desse tipo de avaliação não apenas revela um desconhecimento dos paradigmas modernos de avaliação educacional. Além disso, reproduz um sistema de desigualdade e injustiças sociais historicamente presente na sociedade brasileira, uma vez que, desse modo, os alunos jamais conseguirão desenvolver habilidades e competências necessárias para se alcançar a sua formação integral em decorrência de um bloqueio psíquico ocasionado pelas sequelas de estigmas criados no ambiente escolar sobre a capacidade deles de aprendizagem. Simplesmente são apontados como péssimos naquilo que é proposto para eles aprenderem nos documentos curriculares, quando ainda trilham os terrenos do processo de ensino e aprendizagem. Dessa maneira, jamais conseguirão atingir os seus objetivos por meio da educação, tornando-se a escola num espaço social de encerramento precoce de sonhos. Para Philippe Perrenoud em “Avaliação: Da Excelência à Regulação das Aprendizagens. Entre Duas Lógicas”, o poder da organização escolar, que evidentemente deriva do sistema político, consiste em fazer de uma criança que se equivoca com as retas, que não concorda o verbo com o sujeito ou não domina o pretérito simples, um “mau” aluno.
Eis uma ironia da educação. A mesma escola que difunde o saber e se dispõe a formar cidadãos com habilidades e competências para a inserção no mercado de trabalho, é também a instituição que classifica alunos como ruins ou incompetentes. São duas faces de uma mesma moeda ou duas vertentes de uma mesma escola, sendo que a primeira é redentora e a segunda reprodutora de um sistema social opressor.
Referências:
PERRENOUD, Philippe. Avaliação: Da Excelência à Regulação das Aprendizagens. Entre Duas Lógicas. Porto Alegre: Artmed, 1998.





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