UM SOPRO DE VIDA
Por CLARICE LISPECTOR
Isto não é um lamento, é um grito de ave de rapina
Irisada e intranquila
O beijo no rosto morto
Provavelmente a minha própria vida
Viver é uma espécie de loucura que a morte faz
Vivam os mortos porque neles vivemos
De repente as coisas não precisam mais fazer sentido
Satisfaço-me em ser
Tu és?
Tenho certeza que sim
O não sentido das coisas me faz ter um sorriso de complacência
De certo tudo deve estar sendo o que é.
Quando acabardes este livro chorai por mim um aleluia
Quando fechardes as últimas páginas deste malogrado e afoito e brincalhão livro de vida então esquecei-me
Que Deus vos abençoe então e este livro acaba bem
Para enfim eu ter repouso
Que a paz esteja entre nós, entre vós e entre mim
Estou caindo no discurso? que me perdoem os fiéis do templo: eu escrevo e assim me livro de mim e posso então descansar.
Referência:
LISPECTOR, Clarice. Um sopro de vida (Pulsações). Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1978.
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