A REFORMULAÇÃO DO PAPEL DA ESCOLA

Por AUGUSTO CURY
A escola deve ser um complemento à educação familiar. E, para isso, os professores precisam saber educar a emoção e trabalhar as funções mais importantes da inteligência para formar pensadores, e não repetidores de informações.

Pensadores filtram o que ouvem; repetidores de informações obedecem a ordens, têm baixo nível de consciência crítica e autonomia. Veja o caso da Alemanha pré-nazista. Os alemães ganharam um terço dos prêmios Nobel na década de 1930 do século XX. O país tinha a melhor educação clássica: a melhor matemática, fisica, química, engenharia. Entretanto, isso não foi suficiente para expurgar Hitler, um homem inculto, rude, tosco, mas, ao mesmo tempo, teatral. Quando ele surgiu no cenário com Goebbels, Himmler, Göring e outros, e, junto com eles, começou seu marketing de massa, seduziu a juventude alemã. O Eu do povo alemão perdeu a autonomia.

Numa situação especial, capitaneada por insegurança alimentar, fragmentação política, alto índice de desemprego (30%), humilhação e pesadas indenizações aos vencedores da Primeira Guerra, impostas pelo Tratado de Versalhes, um pool de janelas killer dominava o inconsciente coletivo dos alemães, comprometendo sua consciência crítica. A educação clássica, embora notável, não produziu pensadores coletivamente para rejeitar ou filtrar drasticamente o marketing de massa. Um jovem alemão daquele tempo sonhava, amava e se aventurava como os jovens de hoje, mas, depois de anos bombardeado pelas campanhas nazistas, sua mente estava tão adestrada que ele poderia ser capaz de matar uma criança judia por não tirar o boné na sua presença e, minutos depois, se preparar para assistir a concerto musical.

Como comento no livro O colecionador de lágrimas e em destaque no romance psiquiátrico / histórico Em busca do sentido da vida, Hitler e Goebbels devoraram primeiro o inconsciente coletivo dos alemães para, depois, "devorarem" judeus, marxistas, eslavos, ciganos, homossexuais e outras minorias. Tive a oportunidade de discutir esse tema num debate com alemães notáveis, numa Alemanha que hoje é um exemplo de país que respeita os direitos humanos. Quem imaginaria que a nobre Alemanha de Kant e Hegel seria protagonista daquela atrocidade?

Mas a pergunta que não pode se calar hoje é: com o tipo de educação clássica atual, que forma repetidores de informações, é fissurada pelas redes sociais e atingida frontalmente pela Síndrome do Pensamento Acelerado, estamos preparados para não repetir tais atrocidades quando uma nova de janelas killer, capitaneada por aquecimento global, insegurança alimentar e escassez de recursos naturais, abater o inconsciente coletivo da humanidade? Minha resposta, infelizmente, é "não". Formar pensadores e educar a emoção é vital e urgente.

Referência Bibliográfica:
CURY, Augusto. Ansiedade: como enfrentar o mal do século. A síndrome do Pensamento Acelerado: como e por que a humanidade adoeceu coletivamente das crianças aos adultos. São Paulo: Saraiva, 2015, p. 71-72.



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