"GRACIAS A LA VIDA QUE ME DADO TANTO"

Por Jorge Eschriqui
O amanhecer de cada dia é simplesmente um novo renascimento. E em cada renascimento, quando estamos enfermos, descobrimos aquilo que é realmente essencial em nossas vidas. Talvez até mais que tal fato, despertamos dentro de nós forças que às vezes costumam ficar adormecidas (resiliência da dor, paciência, determinação, fé, coragem...). Também percebemos quem realmente é nosso verdadeiro amigo. Porque se dizer amigo no momento em que você está com plena saúde, sem gastar com tratamento ou medicamentos, indo para eventos sociais, dando presentes, sendo o motorista da "festa" por não beber. Nestes breves instantes, você está rodeado de "amigos".

Entretanto, quando você se depara com a enfermidade e deixa por esta razão de frequentar rodas sociais, parece que tudo era simples ilusão... Olhamos ao nosso redor e nos deparamos a sós. Afinal, onde estava o carro do ano que levava "aqueles amigos" para todos os lugares? Está estacionado na garagem. Qual é a sua serventia, se ele é lindo ou não, se chamava a atenção pelas ruas? Hoje você não pode usufrui-lo. Para que tantas roupas sociais ou casuais de marca se elas não se adaptam mais ao seu corpo e o seu médico até pede para não utilizá-las para não prejudicar a sua pele já bem cansada e com marcas físicas em decorrência dos medicamentos e do tratamento longo e dolorido? Você passa a andar mal vestido e fica com uma aparência física que a sociedade não considera como o modelo ideal de beleza. Deixa de ser percebido e às vezes até torna-se invisível para "aqueles amigos" ou "candidatas à nora da sua mãe" porque você valia mais pela embalagem do que pelo conteúdo. De que serve aquela pessoa que só tem dinheiro agora para pagar consultas, exames, medicamentos e procedimentos que o convênio médico se recusa a pagar ou simplesmente não cobre e pagar advogados para entrarem na justiça com liminares contra o plano de saúde? Além de não poder acompanhar em nenhum evento social mais, não tem um vintém para gastar com nada que não seja doença ou liminares para garantir a manutenção do tratamento fundamental para a sobrevivência.

E o que resta no momento da enfermidade e quando parece que a sua doença não tem fim ou cura? Em primeiro lugar, o autoconhecimento. Reconhecer que às vezes o sofrimento redime de atitudes erradas ou até de indiferenças que demonstramos no passado diante do irmão que precisava de nós e preferimos simplesmente virar o nosso rosto para o outro lado e não o notarmos. A vida é gerida pela Lei da Ação e Reação. Aprendi isto da pior forma: moldado pela dor. O que plantarmos de bom, colheremos de bom adiante. O que plantarmos de mal, o fruto da dor e punição será colhido mais cedo ou mais tarde, independentemente de que a pessoa tenha ou não fé em algo ou alguma coisa nesta vida. A minha mãe sempre me disse e só hoje entendo o sentido desta frase: "Meu filho, a sua bisavó dizia que até das coisas ruins se tira algum proveito". Proveito que ela se refere são aprendizados proveitosos para toda a vida.

Como diz o médico que me trata, quando estamos enfermos há tanto tempo e padecendo, notamos que cada dia importa. Cada dia pode ser o último. Por esta razão, devemos não ter vergonha de valorizar quem realmente é fundamental em nossas vidas e agradecê-las por se fazerem presentes em nossa existência neste plano físico. E quanto aos "amigos de conveniência"? Guardar ódio ou mágoa? Não, embora seja duro reconhecer isto e às vezes venha tomar de conta de nossos corações e nossas mentes o sentimento de vingança (Ah se eu um dia me curar e der a volta...). Porém, não é assim que a vida funciona. Novamente, o que plantarmos hoje, colheremos amanhã. O que jogarmos no universo de sentimentos ruins ou bons, eles retornarão um dia para nós... Se não somos capazes de perdoar, o melhor é nem olhar para o passado, apagar aqueles indivíduos de nossas memórias e biografias e tocarmos a existência em frente.
A doença e, por conseguinte, o sofrimento físico nos ensina a termos fé. Independentemente de qualquer crença ou templo religioso, percebemos que a verdadeira fé no amanhã e em algum ser onipresente e onipotente que pode nos dar força para suportar as dores das injeções, o aspecto físico "deformado" diante do espelho, a ansiedade pela cura que não chega, a depressão que nos ameaça jogar nos braços da morte, etc., deve existir fundamentalmente dentro de cada nós. Também descobrimos as nossas causas de vida e nossos sonhos adiados, mas por enquanto não desfeitos, pois o coração ainda pulsa e a mente ainda raciocina. São elementos fundamentais na batalha pela vida. Simplesmente dão sentido à nossa vida, assim como também aqueles que verdadeiramente nos amam, lutam, apoiam e sofrem conosco a cada piora ou melhora em nosso quadro clínico.

A doença nos faz renascer a cada dia. Sim, renascer... Porque aprendemos a superar os nossos limites de impaciência diante daquilo que não acontece como queremos ou em nosso tempo. Ensina-nos a parar muitas vezes de sermos mimados e querermos que as coisas da vida sejam simplesmente como nós desejamos, sem conceber que há vitórias e derrotas, que cada vitória, por menor que seja, deve ser comemorada. Aquele que não sabe agradecer pelo pouco que ganha em uma batalha, não merece vitórias maiores porque não aprendeu com as quedas e o levantar-se permanentes. A enfermidade faz-nos arrepender de quem magoamos pela trajetória da vida, traz remorsos, pesa a consciência e nos proporciona, assim, reconhecer alguns dos nossos defeitos (senão todos, pelo menos alguns, pois jamais seremos perfeitos). Por que não reconheci que errei e pedi desculpas, ainda que levasse um contundente não? Diante da morte, o orgulho desaparece. As longas esperas em clínicas, hospitais e laboratórios - como se o ponteiro do relógio estivesse estático e o tempo lá fora corresse para aqueles que estão saudáveis e desfrutando da vida por meio do trabalho ou lazer - faz passar na mente o filme da nossa existência até os dias atuais e o que fizemos de bom e de mal. E a consciência quando julga, tem uma imparcialidade e peso em suas decisões que não trata os diferentes de forma diferente, mas todos de forma igual de acordo com o seu grau de culpabilidade. E como dói estes momentos em companhia apenas da consciência e de outros doentes em tratamento. É uma dor tão pungente como a dor física, pois é a dor da alma que clama perdão...

Contudo, nem tudo são apenas lágrimas, dores, angústias, ansiedade... Afinal, como afirmou o meu médico, "vários tombaram na batalha". Uns porque desistiram no meio do tratamento e escolheram a morte como fuga. Outros porque lutaram com as armas que a Medicina ofereceu, mas que não foi suficiente para vencer a enfermidade. "Após quase três anos de luta contra uma doença rara que afeta drasticamente a imunidade do doente e mata sem dó em pouco tempo a maioria dos seus doentes", disse o meu médico hoje, "você é um pouco remanescentes". A minha teimosia - que em muitos momentos foi a minha inimiga, agora se torna a minha aliada... Ah, mas não posso me esquecer de agradecer àqueles que me ajudam a ficar em pé me levando para o tratamento, ajudando a custeá-lo, cuidando do meu patrimônio, amando-me como você estou e não o que eu tenho.

O que um enfermo vê no espelho não é a sua imagem verdadeira. Apenas uma forma passageira e superficial que esconde a beleza que reside dentro dele. Basta ele querer revelar esta beleza autêntica ao mundo mostrando o melhor que há em si. Enxerga quem quer, se não perceberem paciência... A correia da vida ou até mesmo a indiferença humana diante do essencial não possibilita que os indivíduos percebam o espetáculo da Natureza em cada alvorecer ou pôr do sol. Não é mesmo?

Que tal começar hoje a revelarmos a verdadeira beleza dentro de cada um de nós? Que tal aproveitar a época do Natal e do Ano Novo e simplesmente não deixar para o amanhã incerto o que você sente? Nem sempre somos donos do nosso destino, mas somos donos das nossas atitudes. Apesar das aberrações cometidas pela Humanidade, o Natal sempre traz anualmente a esperança quase sempre esquecida de uma vida e um mundo melhor com a celebração do (re)nascimento das verdadeiras ideias - mais igualdade, respeito, simplicidade, paz, harmonia, altruísmo, justiça, etc. - daquele que nasceu em um estábulo e não em um suntuoso palácio, o que nem por isto o fez deixar de ser um exemplo quando o seu legado é devidamente compreendido... Ideias que durante todo o ano deveriam viver dentro de cada um de nós, enfermos ou saudáveis...



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