A INICIAÇÃO NA PESQUISA CIENTÍFICA PODE SER UM IMPORTANTE RECURSO DIDÁTICO PARA A APRENDIZAGEM DE CONTEÚDOS NA EDUCAÇÃO BÁSICA?: O EXEMPLO DA ANÁLISE DE DOCUMENTOS NO ENSINO DE HISTÓRIA

Por JORGE ESCHRIQUI
A História apresenta duas faces. Uma face científica caracterizada pela objetividade e outra artística ou literária marcada pela subjetividade.
A face científica ou objetiva diz respeito à constatação de que a História se constitui em uma ciência que apresenta uma linguagem acadêmica durante a escrita da produção de uma pesquisa (historiografia) e um arcabouço teórico e metodológico próprio no tratamento do objeto de estudo (epistemologia), além de possuir técnicas para identificar a validade dos dados presentes em documentos (heurística).
Contudo, tanto os documentos quanto os trabalhos historiográficos não conseguem contemplar o passado em sua totalidade. Isto se deve sobretudo ao fato de que a produção histórica está permeada pelas visões de mundo e pelos valores, por um lado, daqueles indivíduos que registraram os personagens e acontecimentos passados no momento em que eles ocorreram, fazendo-se uma seleção dos aspectos que foram considerados importantes para registro e perpetuação, constituindo-se em um determinado tipo de memória histórica (o documento monumento, segundo o historiador francês Jacques Le Goff), e, por outro, do próprio historiador que, ao elaborar uma certa narrativa, decide pela escolha de um enredo que seleciona e/ou prioriza também determinados agentes agentes e acontecimentos do passado de acordo com os desafios e questionamentos de seu tempo presente. Afinal, a História tem um papel social e não estuda o passado por ele mesmo, mas o utiliza como forma de compreender a realidade do tempo presente, identificando as possíveis permanências e rupturas (relação entre passado e presente). Entretanto, é necessário salientar que a relação entre passado e presente não pode ser utilizada pelos historiadores para a análise e interpretação do passado a partir de valores do tempo presente, correndo-se o risco assim de se cair no anacronismo. Em suma, tanto os documentos quanto os trabalhos historiográficos são o resultado da construção de um discurso, um enredo e uma narrativa filtrados pelo contexto histórico, pela biografia e por escolhas pessoais daqueles que os elaboram. Esta é a face subjetiva ou literária da História.
A prática didática do trabalho com a análise de diversos tipos de documentos históricos em sala de aula ao longo da Educação Básica é importante exatamente para que os alunos possam compreender, por um lado, que a História é uma ciência que se baseia na análise científica e interpretação de dados de documentos através de uma metodologia própria e não em "achismos" e, por outro, que esta disciplina não é somente o resultado da pesquisa de grandes cientistas alheios à realidade do passado e de seu tempo atual, mas que ao fazer a seleção de certos agentes, acontecimentos e enredos, busca construir uma dada memória histórica que está vinculada às escolhas pessoais. Em outras palavras, a narrativa histórica pode ser pautada em uma perspectiva tradicional fundamentada em grandes fatos e personagens ou em uma concepção mais atualizada que procura tornar todos os indivíduos em agentes da História.
A partir do momento em que o estudante da Educação Básica desenvolve a capacidade de analisar e refletir criticamente sobre o passado, ele se torna um sujeito ativo do processo de ensino e aprendizagem. Dessa maneira, o aluno percebe que a História pode certamente dizer respeito a ele e à sua realidade a depender do tipo de enfoque e da perspectiva adotados no ensino em sala de aula e na pesquisa com documentos.



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