O EXERCÍCIO DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IGUALDADE ISONÔMICA POR MEIO DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA
Por JORGE ESCHRIQUI
A Constituição da República Federativa do Brasil aborda no artigo 5.º o princípio da igualdade nos seguintes termos: "São iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]". De acordo com este princípio constitucional, o exercício da cidadania tem como base a ideia de condições isonômicas para que os indivíduos possam usufruir os seus direitos e cumprir os seus deveres, impedindo-se, assim, tratamentos discriminatórios perante a aplicação das normas jurídicas em decorrência de diferenciações de sexo, raça, religião, convicções filosóficas ou religiosas, orientação sexual, classe social e "deficiências".
Embora teoricamente as diferenças econômicas entre os indivíduos em sociedades capitalistas sejam vistas como normais e explicadas como resultado do trabalho, da capacidade intelectual e do esforço de cada pessoa para ascender a classes sociais mais elevadas, não se deve utilizar tal constatação para justificar processos de exclusão de grande parcela da sociedade do acesso à saúde, à educação, à habitação, à segurança e aos direitos individuais por parte do Estado, uma vez que isto implica em tratamento desigual e discriminatório perante a lei porque não proporciona indistintamente a todos os meios e a isonomia de oportunidades para que possam ascender socialmente e ter dignidade humana. Como o Estado pode garantir um tratamento isonômico perante as normas jurídicas na sociedade brasileira marcada historicamente por profundas desigualdades e pela exclusão social de grande parcela de sua população? Segundo a ciência do Direito, a resposta para tal indagação está na interpretação das leis pelos magistrados e na adoção de políticas públicas pelos gestores de acordo com o preceito que estabelece que "se deve tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na exata medida de suas desigualdades". Em outras palavras, o Poder Público tem que possibilitar uma igualdade material ou substancial para que as normas jurídicas sejam aplicadas a todos os indivíduos, independentemente de raça, cor, sexo, classe social, situação econômica, orientação sexual, convicções políticas e religiosas e "deficiências".
A partir desta afirmação, pode-se fazer outro questionamento relativo à aplicação do preceito acima citado em relação ao direito social fundamental à Educação: Como o Poder Público pode garantir o acesso à Educação para todos os indivíduos, inclusive possibilitando-os o acesso aos níveis mais elevados de ensino segundo a capacidade de cada pessoa? A resposta é por meio de uma escola pública capaz de desenvolver as habilidades e competências necessárias para a formação integral de cada aluno indiferentemente de sua origem social ou possíveis deficiências físicas ou mentais. Tal escola deve ser caracterizada pela acessibilidade, mobilidade, boa qualidade do ensino e cultura altruísta (respeito ao próximo, acolhimento e visão das diferenças como um fator de enriquecimento da experiência de convivência social e não de conflito e discriminação).
A boa qualidade do ensino implica não somente em bons resultados dos alunos em avaliações sistêmicas e no aprendizado de habilidades e competências visando à capacitação e inserção deles futuramente no mercado de trabalho, mas também em uma escola pública de tempo integral que não se restrinja apenas ao processo de ensino e aprendizagem dos componentes curriculares das disciplinas tradicionais. Esta instituição de ensino deve prezar pelo desenvolvimento integral do estudante por meio da prática de atividades no contra turno da grade horária das disciplinas curriculares. O desenvolvimento físico pode ser propiciado através da construção de pequenos complexos esportivos em cada escola que possibilitem a prática de atividades como natação, artes marciais, balé, capoeira, etc. O estímulo ao desenvolvimento cognitivo pode ocorrer por meio de atividades que despertem o raciocínio lógico e o pensamento crítico, como por exemplo, o aprendizado de xadrez, os programas de estímulo à leitura e produção de textos, a implantação de salas de Informática com computadores em quantidade suficiente e programas de software para a recuperação contínua de alunos com dificuldades de acompanhar o ritmo de aprendizagem de determinados conteúdos. Finalmente, uma formação para o exercício da cidadania depende do aprendizado de noções básicas como humanismo, altruísmo, ética, moral, direito, dever, etc., o que pode ser fomentado por meio da sensibilidade e emotividade proporcionadas pela atividade pedagógica do ensino das diferentes artes (cinema, teatro, dança, pintura, escultura) e de filmes e textos filosófico-educativos compatíveis com a idade de cada grupo de discentes que podem ser trabalhados e debatidos didaticamente das mais variadas formas.
Por outro lado, a cultura altruísta de convivência e respeito às diferenças é despertada no ambiente escolar a partir do momento em que inicialmente a instituição de ensino permite o convívio entre crianças e jovens considerados "normais" e outros com "deficiências" físicas ou mentais. Isto ocorre quando a escola pública é pensada para garantir a acessibilidade, a mobilidade, o ensino e o acolhimento de crianças ou jovens "especiais", o que é possível com a construção de rampas de acesso, portas em largura mínima, apoiadores e sanitários exclusivos, de mobiliário que garanta um conforto mínimo, do desenvolvimento de softwares educacionais para a recuperação ou aceleração dos estudos, da criação de salas de apoio psicopedagógico exclusivo para este público em todas as instituições e da formação e capacitação permanente de professores do ensino regular para o processo de ensino e aprendizagem de estudantes com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento, altas habilidades ou super dotação.
Por ser um dos primeiros espaços de socialização dos indivíduos e a educação de qualidade constituir-se em uma importante ferramenta para a redução das desigualdades e da exclusão social, a escola pública é um meio eficaz para a garantia de uma sociedade nacional mais comprometida com a justiça social e a aplicação efetiva da igualdade isonômica perante a lei enquanto fundamento para o exercício da cidadania no Brasil.
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